Vale prepara demissões em massa
Empresa quer que trabalhadores aceitem “suspensão temporária do contrato de trabalho”
Efraim Moura, de Itabira (MG) e Bernardo Lima, de Congonhas (MG)
A Vale anunciou uma série de medidas para reduzir o custo da produção, por causa da crise econômica global: corte de 10% na produção de minério de ferro; mudança na jornada de trabalho; férias coletivas; paralisação de atividades em algumas minas e cancelamento de contratos com prestadores de serviços.
Além disso, com o nome de “suspensão temporária do contrato de trabalho”, a Vale prepara a demissão de milhares de funcionários em todo o país. A empresa está propondo aos sindicatos a assinatura de acordos que prevêem a suspensão temporária dos contratos de trabalho de 2 a 5 meses, para reciclagem profissional, começando em dezembro de 2008. Desta forma, a empresa pagaria somente o salário, como ajuda, e deixaria de pagar os encargos sociais.
Só para a base de Belo Horizonte e Brumadinho, está previsto que sejam suspensos os contratos de 1.200 trabalhadores – 30% da mão-de-obra. Se estender esta proposta para todo o país, como pretende a empresa, a Vale suspenderá o contrato de trabalho de milhares de funcionários.
Os rumores que correm são de demissões ainda maiores – a Vale demitiria 9 mil funcionários no Brasil, sendo 5 mil em Minas.
A “suspensão” é um doce envenenado. Vai ser apresentado com uma embalagem bonita e vistosa, para iludir o trabalhador. Mas a medida prepara as condições para uma demissão em massa, separando milhares de trabalhadores do ambiente da empresa e dos sindicatos. Estes ficarão em casa, sem a proteção dos sindicatos e dos demais companheiros e sofrendo a angústia do desemprego.
Toda a proposta da empresa se sustenta na expectativa de que a crise acabará em dois ou cinco meses, prazo que duraria a “suspensão temporária”. Porém, esta crise não se resolverá em alguns meses. Levará anos. Como opina o economista norte-americano e prêmio Nobel, Paul Krugman, esta crise “aponta para um declínio econômico terrível, brutal e longo”.
A Vale anunciou um lucro líquido de R$ 19,25 bilhões nos três trimestres de 2008, e disse estar preparada para enfrentar a crise, pois dispõe de 15 bilhões de dólares em caixa. Esta quantia seria suficiente para pagar os funcionários da mineradora pelos próximos 20 anos. Mas esses dólares serão usados para “aquisições” e para remunerar os grandes bancos internacionais, os acionistas majoritários da empresa, que atravessam dificuldades em seus países.
Mat2
Sindicatos de trabalhadores da mineração reagem contra demissões
Reunião aprova manifesto contra as demissões e pela estabilidade no emprego
Os sindicatos que compõem o grupo União & Luta (Metabase de Itabira, Metabase de Congonhas e Ferroviários do Espírito Santo) estão contra a suspensão de contratos de trabalho.
No final de novembro, ocorreu uma reunião de sindicatos mineradores, reunindo a Federação dos trabalhadores da Mineração de Minas Gerais, a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Setor Mineral, os Sindicatos dos trabalhadores da extrativa de Paracatu, Patos de Minas, Arcos, Poços de Caldas, Itabira, Congonhas, Ouro Preto e região, além do Sindimina (RJ) e do Sindmármore (ES).
A reunião aprovou um manifesto, que tem como objetivo central a luta pela estabilidade no emprego. Ele se baseia em quatro pontos (veja ao lado), que incluem a redução da jornada e a disposição de levar a luta até o fim.
Tais sindicatos buscarão mobilizar suas bases para impedir as demissões. Também organizarão comitês nos municípios, convocando a população e as associações de moradores a se unir aos sindicatos, em uma grande campanha, como foi a da Alca. Também iremos exigir que os prefeitos, vereadores e partidos se posicionem contra qualquer demissão e pela estabilidade.
Como a Vale é uma empresa com capital estrangeiro, nossa luta terá de ser internacional. Por isso, além dos sindicatos mineradores do país, iremos buscar os sindicatos da Vale de todo o mundo, para levar esta luta em conjunto.
Os sindicatos Metabase de Itabira e de Congonhas/Ouro Preto farão assembléias com os trabalhadores de todas as minas para discutir a crise e preparar a categoria para defender o emprego, ameaçado pela ganância dos patrões.
Nestas assembléias, já deixaremos um aviso aos grandes acionistas da Vale: “Se demitir, vamos parar toda a mina!”
Quadro
O que exigem os sindicatos
1. Nenhuma demissão, estabilidade no emprego, incluindo os trabalhadores terceirizados
2. Nenhuma redução de direitos, adquiridos pelos trabalhadores em décadas de luta
3. Redução da jornada para 36 horas semanais, sem redução de salário, para que todos possam continuar trabalhando
4. Se a Vale e demais mineradoras se recusarem a garantir a estabilidade no emprego e realizarem demissões em massa, as empresas devem ser reestatizadas ou nacionalizadas
“A Vale lucrou muito. Por isso deve garantir os empregos dos trabalhadores”
Confira a entrevista com Paulo Soares, presidente do Metabase de Itabira e com Valério Vieira, presidente do Metabase de Congonhas:
Opinião - A Vale tem como garantir o emprego dos seus trabalhadores?
Paulo Soares: Durante os últimos 10 anos, a Vale remunerou seus acionistas de forma bilionária. Agora, aos primeiros sinais da crise, descarrega sobre os trabalhadores todo o seu peso, enquanto os acionistas recebem seus lucros normalmente.
Neste momento de dificuldades, quem deve arcar com o peso da crise são os grandes acionistas estrangeiros. Para eles, grandes banqueiros, o prejuízo é menor. São apenas alguns de seus muitos milhões. Mas, para nós, trabalhadores, o emprego significa a vida.
A empresa diz que a suspensão dos contratos de trabalho é necessária porque a situação deve voltar ao normal no início do próximo ano. Se isso realmente é verdade, então não tem o menor sentido a suspensão dos contratos e as demissões dos trabalhadores.
A Vale lucrou muito. Por isso, deve garantir os empregos e manter os benefícios sociais dos trabalhadores.
Qual a saída apontada pelo Metabase para barrar as demissões?
Paulo Soares: A Vale tomou medidas que penalizam o conjunto dos trabalhadores e os municípios mineradores. No caso específico de Itabira, a redução de produção já acarretou a demissão de centenas de trabalhadores nas minas de Cauê e Conceição, com demissão de trabalhadores diretos e terceirizados. Isso afeta diretamente a comunidade, porque cada demissão na Vale provoca outras três, em outros setores da economia da cidade. Quem tem de pagar a conta são os acionistas da Vale. Que eles diminuam seus lucros!
Achamos que o primeiro passo é o chamado pela unidade dos sindicatos, para barrar estas demissões e os ataques que virão por parte da Vale. Temos de estar unidos. Os donos da Vale têm de escutar nosso aviso: “Mexeu com meu colega, mexeu comigo!”.
O Metabase de Itabira está cobrando um posicionamento das autoridades, dos governos municipal, estadual, deputados e vereadores, sobre a ameaça de demissões. Muitos destes parlamentares e governantes receberam doações da Vale e das empresas do setor, para financiar suas campanhas. Agora, terão de dizer que vão ficar ao lado dos patrões, contra os trabalhadores.
Valério Vieira: É hora de unir todos, trabalhadores da Vale e das outras mineradoras, comunidade, associação de moradores, igrejas, sindicatos e a população trabalhadora destas cidades.
Não podemos permitir demissão na Vale ou em qualquer outra mineradora! Estamos iniciando uma campanha exigindo estabilidade no emprego, redução da jornada para 36 horas, sem redução de direitos ou salários e a reestatização da Vale e das mineradoras que demitirem.
FRASES destaque
Paulo: “Cada demissão na Vale provoca outras três, em outros setores da cidade”
Valério: “Não podemos permitir demissão na Vale ou em qualquer outra mineradora”
Entrevista – Dirceu Travesso, da Conlutas
“Na Bolívia já têm minas fechando e gente sendo demitida”
No dia 25 de novembro, ocorreu o Seminário Internacional Mineiro, na cidade de Huanuni, na Bolívia. Dirigentes sindicais de vários países estavam lá, para debater os desafios enfrentados pelos mineiros e o atual cenário, de crise econômica. O Opinião Socialista conversou rapidamente com Dirceu Travesso, que viajou com os trabalhadores da Vale e representou a Conlutas e o Elac no seminário
Por Diego Cruz, da redação
Opinião - Como surgiu a idéia deste encontro?
Dirceu Travesso - O seminário começou a ser pensado ainda no Elac, em julho. Estavam lá mineiros do Peru, da Bolívia e daqui do Brasil. Essa idéia do encontro era algo que já queríamos fazer desde então. Agora, com o desenvolvimento da crise, fomos pra lá. Foi o Ronnie Cueto, dirigente mineiro de Marcona, no Peru. Foi o Júlio Freitas, diretor do Sindicato de mineiros de Ouro Preto, da mina de Mariana, da Vale, e eu fui pela Conlutas. Além é claro, do pessoal da Bolívia. Estavam lá a Federação de Mineiros, o Sindicato de Huanuni, uma mina que têm mais de cinco mil trabalhadores, representando a COB (Central Operária Boliviana). O seminário foi realizado no auditório de uma rádio que eles mantém lá. Participaram cerca de 100 pessoas.
O que foi discutido?
Travesso - O tema do encontro foi a crise econômica internacional e a atividade dos mineiros, a “mineraria”, como eles chamam. Esta foi a primeira iniciativa internacional dos trabalhadores para combater a crise, pra discutir uma saída. Foi discutido a necessidade de uma campanha internacional diante dos problemas da mineração, que agora só vão se aprofundar com a crise, por causa da queda dos preços das commodites.
Há dois problemas históricos enfrentados pelos mineiros. Uma é a discussão sobre a soberania nacional, a retomada do controle sobre os minérios, sobre as reservas naturais e as riquezas de cada país.
E agora, com a crise, tem o problema do desemprego. Inclusive lá na Bolívia já têm minas fechando e gente sendo demitida. A reivindicação é a mesma, que é a estatização dos recursos naturais e das minas, para devolver o controle e garantir os empregos.
Selamos um acordo de solidariedade internacional entres os mineiros presentes da Bolívia, do Peru e dos sindicatos de mineiros dirigidos pela Conlutas aqui no Brasil. Fizemos um manifesto pra ordenar uma campanha, um chamado aos trabalhadores da América Latina pra construir a unidade na luta e a resistência internacional, que é a única forma de resistir ao imperialismo.
Como vai ser essa campanha?
Travesso - Vamos fazer o lançamento em La Paz, em uma atividade com a Federação de mineiros e o sindicato de Huanuni, e aqui no Brasil, com o pessoal dos nossos sindicatos da Vale, em Minas Gerais. Vai ser um dia de luta, lançando a idéia de que, para enfrentar a crise, só com mobilização. E defender a estatização sem indenização, pois esses caras já arrancaram o que podiam, então não tem sentido pagar alguma coisa. Defender o controle dos recursos naturais e exigir do governo a garantia do emprego. A campanha também será mais uma oportunidade para fazer um chamado ao restante da América Latina, de unidade em torno a uma política contra a crise.
OLHO
“Esta foi a primeira iniciativa internacional dos trabalhadores para combater a crise”
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